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Inovação: ser uma organização diferente e não só ligeiramente modificada
Para que os empresários possam construir e liderar organizações inovadoras, precisarão conseguir administrar o já conhecido e criar o novo
Os próximos anos provavelmente exigirão inovações e mudanças tecnológicas tão grandes quanto as que alguma vez esta geração já tenha testemunhado. Boa parte, porém, em acentuado contraste com o século dezenove, precisará ser feita pelas organizações estabelecidas, principalmente pelas empresas estabelecidas.
Não é verdade, como geralmente se diz, que as grandes empresas monopolizam a inovação. Pelo contrário, os últimos cinquenta anos foram preeminentemente anos em que pequenas empresas e, muitas vezes, empresas novas e totalmente desconhecidas produziram uma parcela muito grande das inovações mais eficazes. A Xerox não era nada mais do que um pequeno comércio de papel em mil novecentos e cinquenta. Mesmo a IBM ainda era uma pequena companhia, e um simples pigmeu, em seu próprio setor de equipamentos de escritório, durante a Segunda Guerra Mundial. Muitos dos gigantes farmacêuticos de hoje eram pequenas companhias ou mal existiam no final da Segunda Guerra Mundial, e assim por diante.
Mas, ainda assim, cada vez mais, o maior esforço em mudança tecnológica está no desenvolvimento e a na introdução no mercado. Estas atividades não requerem genialidade; requerem uma grande quantidade de gente competente e grandes somas de capital. Estes dois requisitos são, de fato, encontrados em instituições estabelecidas, sejam empresas ou governos.
No geral, as empresas existentes precisarão se transformar em organizações inovadoras. Nos últimos cinquenta a setenta e cinco anos, a ênfase tem sido, apropriadamente, em administrar aquilo que já é conhecido e entendido. Pois o ritmo da inovação tecnológica ( e até mesmo o ritmo da mudança econômica ) nos últimos setenta e cinco anos foi especialmente lento, ao contrário da crença popular.
Agora a empresa precisará tornar-se novamente empreendedora. A função empreendedora, como viu claramente o primeiro economista da Europa continental, J.B.Say ( que viveu entre mil setecentos e sessenta e sete e mil oitocentos e trinta e dois ) há quase dois séculos, consiste em transferir os recursos existentes das áreas de menor produtividade para as áreas de maior produtividade. Não significa, portanto, criar riqueza descobrindo novos continentes, e sim descobrindo novos e melhores usos para os recursos existentes e para os potenciais econômicos conhecidos e já explorados. A tecnologia, embora não seja a única utilizada para este fim, é uma ferramenta importante, podendo até mesmo ser considerada a mais importante.
A grande tarefa da empresa pode ser definida como a de reagir à lei de entropia, específica de qualquer sistema econômico: a lei da produtividade decrescente do capital. Foi nesta lei que Karl Marx baseou sua previsão sobre o fim iminente do sistema burguês ( denominação da época do que hoje se conhece como capitalismo liberal neoliberal ). Pode-sem dizer hoje que aquele sistema realmente acabou ou se transformou num outro sistema hoje conhecido pelo mesmo nome mas totalmente diferente daquele sistema burguês do século dezenove. No entanto, além de o capital não ter se tornado menos produtivo, ele tem continuamente aumentado sua produtividade nos países desenvolvidos ( em reação à tendência assumida pela lei da entropia e obedecendo-a ). Portanto, Karl Marx estava certo em sua premissa. Largada à própria sorte, qualquer economia realmente se moverá rumo a uma produtividade de capital cada vez menor. A única maneira de se evitar a entropia, a única maneira de se evitar que ela degenere em uma rigidez estéril, é a constante renovação da produtividade do capital através do empreendedorismo, ou seja, transferindo recursos de um uso menos produtivo para um mais produtivo. isto é o que leva, portanto, a tecnologia a se tornar mais importante quanto mais altamente desenvolvida em termos tecnológico forem a sociedade e a economia.
Nos próximos anos, quando o mundo terá de lidar com problema populacional, problema energético, problema de recursos e problema básico de comunidade ( isto é, a cidade ) ( e isto, em grande parte já está acontecendo ), esta função provavelmente se tornará cada vez mais importante; a propósito, isto ocorrerá independentemente de qual seja a estrutura política, social ou econômica de uma economia desenvolvida, isto é, independentemente de o sistema ser capitalista do tipo liberal ou neo liberal, socialista, comunista com as modificações introduzidas nos século vinte e vinte e um ou qualquer outra coisa nova que tenha surgido ou venha a surgir na sociedade pós-capitalista.
Isto exigirá que os empresários aprendam como construir e administrar uma organização inovadora. Em geral, a organização inovadora tem sido discutida em termos de criatividade e de atitudes. Na verdade, porém, ela precisa de políticas, práticas e estrutura. Ela requer, em primeiro lugar, que a gestão antecipe as necessidades tecnológicas, identifique-as, planeje para elas e trabalhe para que sejam satisfeitas.
Ela requer, em segundo lugar, de forma talvez mais importante, que a gestão abandone, de maneira sistemática, o passado.
A criatividade é, em grande medida, uma desculpa para não se fazer algo. O problema em muitas organizações incapazes de inovar e se renovar é que elas não conseguem desprender-se do passado, do desgastado, daquilo que não é mais produtivo. Pelo contrário, elas tendem a alocar nisto seus melhores recursos, especialmente seu melhor pessoal. Qualquer corpo que não consegue eliminar os resíduos de produtos acaba envenenando a si próprio. Para tornar uma organização inovadora, é necessário adotar uma política sistemática de se abandonar aquilo que efetivamente não se mostra mais produtivo, aquilo que verdadeiramente não esteja mais contribuindo. A organização inovadora requer, acima de tudo, que cada produto, cada processo e cada atividade sejam postos periodicamente em julgamento por sua continuidade ( talvez a cada dois ou três anos ). A pergunta a ser feita é a seguinte: "Se já não fizéssemos isto atualmente, faríamos o mesmo a partir de agora ( sabendo o que sabemos hoje )?". Se a resposta for negativa, então não se deve perguntar: "Devemos abandonar isto?". A pergunta a ser fazer em seguida é: "Como podemos abandonar isto, e com que rapidez?".
A organização que, sistematicamente, se desprende do antigo, seja ela uma empresa, uma universidade ou uma agência governamental, não precisa se preocupar com a criatividade. Ela terá um apetite tão saudável pelo novo que a principal tarefa da administração será selecionar, dentre a grande quantidade de boas ideias novas, aquelas com maior potencial de contribuição e aquelas com maior potencial de execução bem-sucedida.
Além disto, a organização inovadora precisa de políticas específicas. Ela precisa de sistemas de informação e de medição que sejam apropriados à realidade econômica da inovação ( a regular, moderada e contínua taxa de retorno sobre o investimento [ ROI - sigla em inglês ] seria uma medida errada ). A inovação, por definição, representa apenas custos por muitos anos, antes de gerar lucro. Ela é, em primeiro lugar, um investimento e se transforma em retorno somente muito depois. Mas isto também significa que a taxa de retorno deve ser bem maior do que a maior taxa de retorno para a qual os gestores planejam no tipo tradicional de empresa. Precisamente pelo fato de que o tempo de espera ser longo e a taxa de fracasso ser elevada, uma inovação bem-sucedida em uma organização inovadora deve visar á criação de um novo negócio com potencial para a geração de riqueza, em vez de uma adição simples e agradável ao que já se possui e ao que já se faz normalmente.
Finalmente, é necessária a contatação de que o trabalho inovador não pode ser organizado e realizado dentro das unidades administrativas normais, ou seja, departamentos preocupados principalmente com o trabalho de hoje e do futuro. Ele precisará ser organizado em separado, com princípios estruturais diferentes e em componentes estruturais diferentes. Acima de tudo, as demandas de autodisciplina na gestão e de clareza no direcionamento e nos objetivos são muito maiores no trabalho inovador e devem ser estendidas para um círculo muito maior de pessoas. Assim, a organização inovadora, embora fazendo parte organicamente do negócio em andamento, precisa ser separada estrutural e administrativamente. Para que os empresários possam construir e liderar organizações inovadoras, precisarão, então conseguir fazer ambas as coisas: administrar o já conhecido e criar o novo e desconhecido. Precisarão conseguir otimizar o negócio existente e maximizar o negócio em potencial.
Para a maioria dos empresários, estas ideias são estranhas e, de fato, um pouco assustadoras. Mas existem muitas empresas realmente inovadoras no mercado ( em praticamente todos os países ) mostrando que a tarefa pode ser realizada e que certamente é factível. Na verdade, é necessário, em primeiro lugar, o reconhecimento ( que falta até agora no pensamento administrativo e em quase toda literatura sobre gestão ) de que a organização inovadora é uma organização distinta e diferente, e não apenas uma organização tradicional ligeiramente modificada. Outras informações podem ser obtidas no livro Rumo à nova economia, de autoria de Peter F. Drucker.