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O Espírito de Equipe

Mas, nos dashboards corporativos, não devemos esquecer que pessoas são apenas um terço da pizza.

Autor: Luís Sérgio LicoFonte: Administradores.com

Algumas situações são sintomáticas nas organizações. Por exemplo: Quando se quer melhorar as coisas e não se vê saída, sempre ouvimos a seguinte expressão: Precisamos melhorar o espírito de equipe!

Fico pensando que tipo de fantasma será esse que todos perseguem e que, uma vez alcançado resolveria os problemas. Deste ponto de vista, parece que as pessoas são o grande fator de desajuste nas empresas e, bastaria apelar para a consciência de uma condição intangível, para evitar a fragmentação. Afinal, tudo aquilo que não pode ser mensurado em milissegundos e replicado ad perpetuum, está na esfera do humano.

Mas, nos dashboards corporativos, não devemos esquecer que pessoas são apenas um terço da pizza. Também existem processos e ferramentas do modo produtivo, que se não estiverem adequadas, produzem mais dor que felicidade. Mais que isto: existem intrincadas redes relacionais de interação entre estas três dimensões e que compõe um cenário dinâmico, sem falar na questão do meio envolvente externo.

Logo, quando se fala em teambuilding, deve-se ter em mente não apenas indivíduos e seus supostos gaps, mas sua maneira de atuar no ecossistema corporativo, incluindo aí a instância crítica do comportamento frente a estas divisões.

Claro que uma organização significa a união de esforços, visando um fim produtivo e útil (embora poucas realmente cumprar este papel), que desenvolve suas atividades dentro de padrões estabelecidos, rumo a objetivos bem determinados. Mas, a pressão rotineira por metas e resultados, frente à maneira pela qual são feitas as coisas também determina os resultados alcançados. Isto significa que as ações, em qualquer profissão, precisam de um sentido claro, que oriente todo o trajeto de esforços diários.

Fora isto, poucos parecem levar em conta que existe toda uma trajetória de vida, que inclui desde a formação educacional e cultural deficitária do brasileiro, até as crenças, valores e necessidades do capital humano e que também deve ser considerada na equação. Mas, como a miopia organizacional é sempre o maior fator de atraso, a tendência de pessoas que lideram é colocar a culpa nas pessoas que devem ser lideradas. É aí que morre a responsabilidade social empresarial, não importa quantas cestas básicas ou ingressos o patrão distribua, pois o abatimento fiscal não proporciona aderência.

Contudo, se o caso é “mexer com o pessoal”, precisamos entender que, frente a este cenário, fazer de um amontoado de colaboradores uma equipe de trabalho é realmente um grande desafio. Ali estão envolvidas algumas particularidades, como a comunicação aberta, disposição permanente para alinhar processos, melhorar ferramentas, instituir práticas democráticas, melhorar a delegação e permitir a flexibilidade no exercício das funções.

Não basta apenas chamar a atenção ou colocar cartazes pedindo a colaboração. Devemos estar atentos a tudo o que facilite o exercício das capacidades individuais e uma atuação criativa e saudável de cada um. É preciso criar espaços para a expressão humana e adequar as disciplinas. Fora isso, devemos lembrar que sempre cobramos posturas proativas, mas esquecemos de três aspectos cruciais e uma quarta dimensão de instância ética:

1 – Desde o maternal até a faculdade, ninguém foi ensinado como aprender a aprender.
2 – Nunca nos avaliaram de forma coerente, de forma a possibilitar o melhor desenvolvimento de nossas competências e aptidões. Nem houve o menor suporte a estas possibilidades ou sequer pensaram em formar indivíduos conscientes.
3 – Neste mesmo trajeto, apenas em busca de reposição de peças, a educação brasileira sempre formou pessoas para serem funcionários, ou seja: focados estritamente na “atividade”.Nunca formou empreendedores e nos ensinou a lidar com padrões de decisão, análise e risco.
4 – Corporações, em geral, assim como os consumidores não se interessam pelo bem estar planetário ou individual. Os primeiros desejam, mormente produzir, reduzir custos e aumentar a lucratividade; Os segundos apenas querem acesso aos bens produzidos, utilizá-los e depois, descartá-los, para adquirir novos. É uma equação social sinistra.

Mas, voltando ao ponto das equipes, temos aqui exato momento onde o caldo entorna. Dificilmente o individualismo reinante consegue transpor barreiras. O espírito de equipe é essencial para o alcance do sucesso, mas historicamente esta condição sempre esteve ligada a um objetivo superior. Uma equipe participativa, homogênea, coesa, vale mais do que um batalhão de pessoas com posicionamentos isolados. Isso vale para qualquer área da nossa vida, especialmente a profissional. Porém, o que vemos é o egoísmo imperar!

Mas, se apenas desejarmos, de um lado, obrigar as pessoas a entregar toda sua capacidade produtiva, desprezando as pedras angulares da humanidade e dignidade, teremos na outra face da moeda profissionais que apenas entendem a organização como fonte de renda e espaço ocupacional compulsório. Assim, a conta nunca fecha! Existe uma profundidade intensiva de redes relacionais que deveriam estar interconectadas, mas na verdade estão em curto circuito.

Vivendo em ambientes confinados, lutando contra a assimilação corporativa do tempo individual, e desejando adquirir cada vez maiores quantidades de produtos, acabamos acumulando enormes índices de culpabilidade. Tanto que um dos mais interessantes hoaxesda web, nos dá conta que um novo produto chamado “Sacos de Culpa Descartáveis” apareceu no mercado Norte Americano, causando estrondoso sucesso.

Consistia, segundo a lenda, de um conjunto de dez simples sacos marrons, em que foram impressas as seguintes instruções: “Coloque o saco com firmeza sobre a boca, respirar fundo e explodir toda a sua culpa para fora, em seguida, descartar o saco de imediato”. A maravilha disso é que a Associated Press relatou que 2.500 kits foram rapidamente vendidos a $2.50 por kit. Pena que não consegui comprar nenhum!

Mas, será que podemos dispor de nossa culpa tão facilmente? Mas, no que ela consiste, senão na intuição clara de vivermos num mundo incompreensível, onde tememos confiar uns nos outros e necessitamos levar vantagem em tudo? O desespero oculto em nosso modo de vida leva à busca de soluções fáceis, indolores, para todos os descasos.

Só que, não há nada nesta terra bastante poderoso em si mesmo para eliminar nossa culpa, que não passe – obrigatoriamente – pela construção de uma coletividade responsável, pela conduta reta e por uma sadia relação com este novo modo de vida, que é o ambiente corporativo, onde passamos a maior parte de nossa existência.

Assim, ao se falar em espírito de equipe, esqueçam as manjadas frases sem efeito dos melodramáticos e ultrapassados motivadores profissionais. Também abandonem o chicote, pois ninguém mais suporta assédio e todos os profissionais repudiam a incompetência, seja de líderes ou subordinados. Privilegiem apenas o caráter! Se quiserem, leiam Emerson. Vai ajudá-los a compreender o que digo.

Pessoas hoje precisam entender o que fazem e porque fazem, para poderem interagir de forma produtiva. Assim, se as pessoas não estão colaborando como deviam, além de olhar para o que dissemos, procurem as soluções na melhoria dos processos e evoluam as ferramentas, de maneira a permitir uma interface amigável. Devemos ter em mente que estamos construindo uma nova matriz de sociedade e que a coerência e o desenvolvimento de boas práticas deve caminhar lado a lado com a eficiência.

Aliás, um mundo totalmente eficiente, sem margem para erros e experimentações, seria apenas um mundo cético. Absolutamente fenomênico, vazio e asséptico. Além disso, traria dentro de sua cientificidade, o germe de sua destruição. Pois, um mundo cético, como diz o professor Marcelo Moreira seria um mundo que aboliu toda a sua diversidade e padronizou todas as suas possibilidades, até o esgotamento de sua alma.

Um mundo que consistiria apenas de eucaliptos e pardais.